O poder transformador do riso  

 

O Dia Internacional do Riso, celebrado em 18 de janeiro, é uma ocasião especial para refletir sobre a importância do humor na promoção da saúde mental. Com inspiração em Patch Adams, conhecido como o Doutor do Riso, cuja terapia fundamentada no riso transformou a abordagem médica, especialistas do Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz) exploram como o riso impacta positivamente a saúde emocional das pessoas. Esta reflexão ocorre em consonância com o "Janeiro Branco", campanha que destaca a importância de dar atenção aos aspectos emocionais, reforçando a conscientização sobre os cuidados com a saúde mental.


A terapia do riso é usada no IFF/Fiocruz para aliviar o estresse e alegrar
a rotina do ambiente hospitalar

 

Antecedentes: Patch Adams, o doutor do riso

Patch Adams, interpretado por Robin Williams em um filme de 1998, é um médico americano que revolucionou a abordagem médica ao incorporar o riso como parte integrante da terapia. Seu enfoque humanista é baseado na ideia de que o humor e a alegria são fundamentais para o processo de cura. Adams fundou um centro de saúde sem fins lucrativos, onde a abordagem terapêutica inclui o uso do riso como uma ferramenta valiosa no alívio do sofrimento e na promoção do bem-estar emocional e físico dos pacientes. 

Hoje, a terapia do riso é usada em milhares de hospitais ao redor do mundo, e o IFF/Fiocruz é um deles, com um foco na atenção amigável o Instituto emprega alegria, humor, brincadeiras e afeto para fazer mais leve a rotina das crianças hospitalizadas e seus familiares.

Benefícios da terapia do riso  

A relação entre humor e saúde mental é evidenciada em estudos que revelam os benefícios do riso, pois rir estimula a produção de endorfinas e a regulação emocional através da serotonina, conforme aponta a psicóloga do IFF/Fiocruz, Kátia Moss. “Além de agir como moderador de estresse, reduzindo os níveis de cortisol, o senso de humor também propicia interações sociais positivas, fundamentais para lidar com desafios do cotidiano”.

Assim, a terapia do riso como método complementar visa não apenas alívio físico, mas também à promoção de bem-estar mental. O humor influencia a sociabilidade do paciente, atuando como um grande facilitador no relacionamento com a equipe de profissionais de saúde, por ser também uma abordagem de baixo custo e fácil aplicação.
Eventos traumáticos afetam o senso de humor, mas a ressignificação positiva, aliada a suporte profissional e práticas que estimulem momentos de leveza, é crucial para o enfrentamento. “A abordagem deve ser cuidadosa, respeitando as dimensões do trauma e a necessidade de recolhimento. O humor é um aliado a resiliência”, destaca a psicóloga do IFF/Fiocruz.

Por outro lado, embora rir seja beneficioso, é fundamental atentar para o contexto ao considerar situações em que o riso pode ser inapropriado. “O riso também pode refletir nervosismo, destacando a complexidade das interações entre emoções e humor. Por isso, a apropriação do riso exige atenção às circunstâncias para evitar situações constrangedoras, ainda mais no âmbito hospitalar”, ressalta Kátia Moss.


No IFF/Fiocruz é importante não apenas fazer rir, mas também trazer o lúdico,
entendendo o brincar como recurso terapêutico

 

Rir: o melhor remédio  

Em meio aos desafios dos tratamentos médicos, o IFF/Fiocruz destaca-se por adotar abordagens terapêuticas centradas no riso, promovendo alívio emocional e momentos de alegria para crianças, adolescentes, mulheres e seus acompanhantes. A incorporação do riso como parte dos processos terapêuticos na instituição remonta ao Saúde Brincar, projeto iniciado em 1994 baseado no brincar como recurso terapêutico. Em 2012, com a criação do Núcleo de Apoio a Projetos Educacionais e Culturais (Napec), o Instituto expandiu essas práticas para diferentes espaços, como o “Parquinho” (espaço de lazer na sala de espera), leitura e música por toda parte.


A leitura de histórias e a apresentação de músicas são atividades lúdicas
que proporcionam momentos de alegria e descontração para as crianças internadas

 

O riso surge naturalmente durante atividades lúdicas, como leitura de histórias ou apresentação de músicas, proporcionando momentos de alegria e descontração para as crianças hospitalizadas. A coordenadora do Napec, Magdalena Oliveira, acredita no acolhimento, carinho e cuidado como elementos fundamentais para a recuperação, mas entendendo o papel fundamental do brincar como linguagem universal da infância. “O Napec não busca apenas fazer rir, mas também trazer a realidade infantil para dentro das enfermarias, promovendo sorrisos espontâneos através de interações baseadas na fantasia e no faz de conta”, comenta Magdalena.

Histórias de casos exemplificam como o uso terapêutico do riso teve impacto positivo na vida e recuperação de crianças internadas, elevando a autoestima e criando experiências recompensadoras. “Pequenos gestos, como proporcionar uma maquiagem infantil para uma adolescente deprimida, podem transformar a experiência hospitalar”, ressalta a coordenadora do Napec. 

Magdalena ainda destaca o caso de um menino resistente à internação, cujas birras cessaram ao ser envolvido em cantorias, sublinhando como abordagens terapêuticas baseadas no humor podem influenciar significativamente a adesão ao tratamento. Essas experiências compartilhadas pela coordenadora do Napec ilustram os benefícios do riso na promoção da saúde mental dentro do ambiente hospitalar e sua eficácia como agente de inclusão e resgate da infância interrompida.

Esse nobre trabalho é possível graças à intervenção dos voluntários do Napec, grupo de pessoas que gostam muito de crianças e querem fazer a diferença no mundo. “Para atuar como voluntário, a pessoa tem que ser espontânea, simpática, ter disponibilidade de pelo menos duas horas e meia por semana, saber ler com fluência e ter entre 18 e 66 anos. O trabalho do voluntariado desempenha um papel crucial na oferta dessas experiências terapêuticas baseadas no humor”, confirma Magdalena.


O palhaço Adamastor (Guilherme Miranda) e a palhaça Shei-lá (Julia Schaeffer)
da “Roda de Palhaços” levam alegria aos pacientes, fazendo com que por vezes esqueçam que estão internados

 

Palhaços de hospital: rindo na adversidade 

Guilherme Miranda, um dos palhaços de hospital vinculados ao IFF/Fiocruz através do Napec, ressalta a conexão entre o riso e a saúde mental. "Como o Palhaço Adamastor, meu objetivo é levar alegria aos pacientes, proporcionando um clima mais leve e descontraído. Muitas vezes, as crianças esquecem que estão em um ambiente hospitalar enquanto compartilhamos momentos de riso e brincadeiras", refere Miranda. “A risoterapia não é apenas sobre entretenimento, mas uma ferramenta terapêutica muito poderosa, pois tem a capacidade de aliviar o estresse, melhorar o humor e criar uma atmosfera positiva, o que é fundamental para qualquer processo de cura".

Guilherme faz menção especial à importância de adaptar suas abordagens de acordo com as necessidades individuais dos pacientes. "Cada pessoa reage de maneira única ao humor, e é essencial respeitar essas diferenças. Algumas crianças preferem brincadeiras mais sutis, enquanto outras gostam de humor mais expansivo. Estar sensível às necessidades emocionais de cada paciente é fundamental para criar uma interação terapêutica eficaz".

O palhaço de hospital ressalta também a relevância do riso na promoção da saúde mental não apenas para os pacientes, mas também para suas famílias e a equipe médica. "Ao criar um ambiente mais positivo e otimista, o riso não só beneficia os pacientes diretamente, mas também impacta positivamente aqueles ao seu redor. Famílias e profissionais de saúde se beneficiam da atmosfera leve que o riso proporciona, contribuindo para um ambiente mais acolhedor e colaborativo no hospital”.

Guilherme continua. “O respeito que existe quando o trabalho é reconhecido é bonito de se ver. Os palhaços sabem quando precisam esperar algum procedimento para começar a brincadeira e os médicos também entendem quando a criança necessita mais daquela visita do que determinada atuação médica. As famílias realmente me emocionam, principalmente após ser pai. Acompanhamos (às vezes por anos) a luta de pais, mães, avós, que dão suporte integral à sua criança. Desta maneira, eles ficam normalmente muito ansiosos pela chegada dos palhaços para viverem, às vezes até mais intensamente que seus filhos e netos, aquele momento de interação lúdica e fuga daquela realidade difícil”.

Essas reflexões de Guilherme Miranda destacam a importância contínua de rir como uma ferramenta terapêutica valiosa no contexto da saúde mental, onde as brincadeiras e o riso reacendem a chama da alegria nas crianças hospitalizadas, possibilitando o reencontro com sua própria essência lúdica, além de ser um estímulo a mais no processo de recuperação e cura.

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