Semana Científica do Centenário IFF/Fiocruz aborda “Morbimortalidade materna e estratégias de redução”

 

A conferência “Morbimortalidade materna e estratégias de redução”, proferida pelo diretor do Centro Latino-Americano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde (BIREME), João Paulo Souza, ocorreu dia 3/4/24 durante a Semana Científica do Centenário do Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz).

“A morte materna não é apenas uma questão de saúde, é colocada como um objetivo de desenvolvimento sustentável, uma meta que reflete um grau de desenvolvimento social e econômico. Por isso, faz parte de um esforço global de desenvolvimento e prosperidade, uma abordagem muito mais ampla e complexa”, iniciou João Paulo Souza.

Um outro aspecto da mortalidade materna abordado foi a evitabilidade. “A maioria das mortes são evitáveis, com exceção de 1 a 3%. Como grande parte dos casos acontecem em populações em desvantagem socioeconômica, os fatores e contextos sociais precisam ser levados em consideração, pois eles acabam se materializando no corpo das mulheres, e não apenas focar, como de costume, em causas biomédicas, como hemorragia, infecção e hipertensão”, ressaltou o conferencista.

João Paulo ponderou que a saúde é um direito de todos e um dever do Estado, como está descrito na Constituição, mas não está garantido. “Estamos em um processo contínuo de construção e defesa disso. Passamos muitas décadas falando exclusivamente de causas biomédicas, mas precisamos lembrar que as mulheres estão morrendo por injustiça social e de gênero. Nesse sentido, é fundamental a questão cultural na construção do sistema de saúde e a maneira como esse sistema interage com os outros fatores, como no Afeganistão que tem uma cultura de opressão que é um fator muito prejudicial. Então, também precisamos conseguir dar a devida importância a essas questões”.

Acesso universal de saúde: alcançar o acesso universal a serviços de saúde de qualidade é essencial para saúde das mulheres antes, durante e depois da gestação

A moderadora da conferência, a coordenadora de Ações Nacionais e de Cooperação do IFF/Fiocruz, Maria Gomes, ressaltou que as questões abordadas pelo conferencista estão absolutamente alinhadas com os papéis centrais do Instituto: promoção da saúde das mulheres, garantia dos seus direitos sexuais e reprodutivos e dos seus direitos de viverem. “Precisamos trabalhar de uma maneira muito articulada para a redução das mortalidades materna e neonatal, não só como objetivos de desenvolvimento sustentável, mas também de objetivos de vida e de luta de muitas e muitos de nós”.

Maria salientou que o direito à saúde depende fundamentalmente do cuidado clínico realizado de forma adequada e integral. Dessa forma, o IFF/Fiocruz, atuando em seu papel de Instituto Nacional do Ministério da Saúde, está presente nos esforços de melhoria do cuidado clínico e do fortalecimento da capacidade das redes de atenção ganharem, a partir do seu planejamento, da sua gestão das redes de atenção, uma trajetória baseada nas melhores evidências. “O Instituto, como instituição executante de estratégias nacionais para a redução da morte materna, trabalha com equipes técnicas e gestoras dos 26 Estados e Distrito Federal. Estamos presentes no desenvolvimento de tecnologias e recursos educacionais mais inovadores voltados para a equipe multiprofissional. Em 2017, lançamos o Portal de Boas Práticas em Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente, de acesso livre e gratuito e integrado por instituições de ensino e pesquisa de todo o Brasil”.

Aproveitando a oportunidade, Maria enfatizou que o IFF/Fiocruz também está atuando em ofertas de objetos educacionais voltados para a redução da Mortalidade Materna por Hipertensão, Hemorragia e Infecção em ambiente interativo; está disponibilizando um sistema de apoio à decisão clínica no cuidado pré-natal e nas urgências obstétricas (SADEC) e no monitoramento de práticas e desfechos obstétricos em maternidades brasileiras. “Nesse momento, com cerca de 35 maternidades, mas já gerando uma base de mais de 100 mil registros obstétricos, possibilitando a análise de práticas e desfechos no cuidado materno e neonatal, avançando no programa de Saúde Digital, algo que o Ministério da Saúde vem buscando implantar”.

Na sequência, os painelistas da conferência trouxeram suas contribuições ao debate. A coordenadora da Comissão de Residência Médica e supervisora do Programa de Residência em Ginecologia e Obstetrícia do IFF/Fiocruz, Ana Elisa Baião, reforçou que o fortalecimento do aprimoramento técnico tem que ser constante do ponto de vista da formação médica, da enfermagem obstétrica e de todos os profissionais envolvidos na atenção na área da gestante, para efetivamente conseguir reduzir a mortalidade.

“Um dos grandes desafios que a gente tem na formação desde a graduação médica, e isso se perpetua na residência, é a articulação que temos que ter na formação do profissional que vai estar envolvido em uma formação técnica. Um aspecto muito importante nessa luta para redução da mortalidade é a formação baseada em evidências, no contexto socioeconômico que precisamos lidar, a avaliação crítica do cuidado, articulação em rede, além da atenção às vulnerabilidades da população que atendemos”, disse Ana Elisa.

Para a gestora da Área de Atenção Clínico-cirúrgica à Gestante do IFF/Fiocruz, Aricele Ferreira, ao mesmo tempo em que temos avanços, vemos o quanto ainda precisamos trabalhar para realmente mudar esse panorama global. “Não podemos ver somente como números, a morte de uma mulher tem que ser vista como uma tragédia e não apenas como mais um dado. Estamos evoluindo nos conceitos: falamos de saúde reprodutiva, depois de direitos reprodutivos e, hoje, em busca da justiça reprodutiva, que é ter disponível para as mulheres o que elas precisam. É uma grave violação dos direitos humanos quando falamos de mortalidade materna”.

Aricele informou que o Instituto possui um sistema de monitoramento do cuidado obstétrico e neonatal, que é uma ferramenta que ajuda gestores e profissionais a olharem para o que está sendo feito. “Termos dados globais é importante, mas sabermos a realidade dentro da nossa própria unidade é uma forma da equipe atuar de forma efetiva e controlada para conseguirmos evitar o pior desfecho, que é a morte. Avaliar as práticas assistenciais e, a partir disso, poder traçar estratégias para melhorar a qualidade do cuidado no dia a dia é fundamental, um avanço”.

Aricele destacou também a importância da Enfermagem Obstétrica como um fator que pode contribuir na redução da mortalidade materna, através da qualificação do cuidado baseado nas melhores evidências clínicas, favorecendo a redução no número de cesáreas desnecessárias e na melhora dos indicadores de saúde.

O obstetra do IFF/Fiocruz, Marcos Nakamura, analisou alguns desafios no cenário brasileiro. “Temos as mulheres engravidando mais tardiamente, com comorbidades, e ainda não resolvemos o problema das mortes maternas diretas. Então, agora precisamos conviver com as causas diretas, além de lidar com as causas indiretas sendo cada vez mais prevalentes. Organizar o sistema também é um desafio imenso, mas temos bons exemplos no Brasil que conseguiram avançar um pouco nesse ponto e têm menores razões de mortalidade materna, como o Rio Grande do Sul e Paraná”.

No encerramento, o conferencista, João Paulo Souza, deixou uma mensagem. “A saúde para todos é possível, precisamos lutar para não deixar ninguém para trás, especialmente, no nosso caso, na saúde materna, neonatal e infantil. Sempre temos que ter em mente a nossa missão e propósito. Nossa tarefa é difícil, mas vamos chegar lá!”.

Da esquerda para a direita: Marcos Nakamura, Ana Elisa Baião, Maria Gomes, Aricele Ferreira e João Paulo Souza


Sobre a Semana Científica

No contexto do Centenário do Instituto, a Semana Científica, realizada de 2 a 4/4, teve como objetivo discutir temas relevantes à saúde e ao cuidado de mulheres, crianças e adolescentes. Foi organizada pelo Núcleo Diretor do IFF/Fiocruz e financiada pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ) e Academia Nacional de Medicina (ANM). A Semana contou com uma agenda repleta de conferências e mesas-redondas, que abordaram temas fundamentais para profissionais e estudantes, sendo uma oportunidade valiosa de discutir os tópicos trazidos pelos experientes conferencistas e a busca de soluções para os desafios expostos.

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